Motorista transforma trajeto escolar em jornada de leitura e superação em Humildes

O caminho até a Escola Municipal Nossa Senhora das Candeias, no distrito de Humildes, já não é o mesmo desde que Davi Lima Almeida, de 40 anos, assumiu o volante do transporte escolar. O que antes era apenas o ir e vir das aulas virou, dentro daquele ônibus, uma viagem recheada de páginas, histórias e autoestima.
Foi de uma ideia simples que tudo começou: uma caixa de sapato esquecida e alguns livros antigos que ele tinha em casa. “Levei pro ônibus e deixei ali do lado. Quem quisesse, podia pegar”, conta. O convite tímido logo virou hábito entre os alunos. Com o tempo, os mais acanhados foram se aproximando, lendo em voz alta, trocando livros, ajudando uns aos outros.
Davi não se limitou a oferecer leitura — ele criou um ambiente de estímulo e crescimento. Para vencer a vergonha dos pequenos, propôs desafios leves, recompensas simbólicas: uma bala, uma pipa feita de material reciclado, colhida por ele mesmo nos arredores. “Eles começavam a se soltar, a ajudar os colegas. Era bonito de ver. A leitura unia”, lembra com orgulho.
Hoje, o ônibus que cruza estradas de terra e ladeiras virou ponto de encontro para quem quer aprender mais. No lugar do silêncio, surgiram conversas, risadas e leituras em grupo. E o cansaço? Fica pelo caminho. “Pedalo todo dia uns 16 minutos pra chegar aqui. Mas quando vejo aquelas crianças se animando, aprendendo, tudo isso se apaga. Me encho de energia de novo”, diz.
Davi ainda transforma o vidro do ônibus em um painel de boas-vindas: anota contas de matemática, frases de incentivo, poesias. Em semanas de prova, o veículo vira uma sala de estudo itinerante — os alunos trocam perguntas e revisam juntos enquanto seguem rumo à escola.
Com gestos pequenos, mas repletos de significado, Davi prova que educar também é possível nas estradas. E que, muitas vezes, é no percurso que as grandes transformações acontecem.