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Feira de Santana / 15 de julho de 2021 - 01h 08m

Fundação Hospitalar censura reclamações contra o Hospital da Mulher

Fundação Hospitalar censura reclamações contra o Hospital da Mulher
Compartilhamento Social

Inara Almeida , repórter

“Belo dia será quando você chegar. Um travesseiro e um cobertor e o carinho que dá e sobra. Comprei até ventilador e arrumei o seu guarda-roupa. Você nem sabe quando vem, mas já tem amor para a vida toda”, canta Mallu Magalhães em homenagem a sua filha que estava para vir ao mundo, ilustrando os únicos sentimentos que deveriam pairar sobre uma grávida: amor e boas expectativas. Infelizmente, o relato da nutricionista Gisele Medrado no Instagram é de uma experiência traumática vivida no Hospital da Mulher de Feira de Santana, acompanhado por diversas outras mulheres que a procuraram para dizer que passaram por situações semelhantes no mesmo hospital.

No último mês de junho, Gisele deu entrada no Hospital da Mulher esperando ter um parto de sucesso e o mais natural possível, já que teve uma gravidez tranquila, sem intercorrências e de muito preparo. Mesmo com plano de saúde, ela optou pela rede pública e confiou na definição de “hospital amigo do bebê” e nos “dez passos para o aleitamento materno perfeito” que ele propõe, mas a sua experiência foi marcada por maus tratos e descaso. A jovem conta que foi mandada “calar a boca” por uma enfermeira, tratada com muita impaciência pelo médico de plantão, que em nenhum momento se apresentou e determinou a realização da cesárea sem dar nenhuma explicação para Gisele, que não conseguiu questionar a escolha por conta da intensidade das dores que sentia. Depois do parto, a equipe não levou a recém nascida até a mãe, sendo necessário Gisele pedir para ver a filha, pouco antes de ser deixada sozinha na sala de parto por horas. Gisele afirma ter sido ignorada diversas vezes quando questionava sobre a sua filha ou sobre se o seu marido havia tido notícias dela.

Mayra Santos, 25 anos, não teve mais sorte que Gisele. A jovem, que deu entrada no Hospital da Mulher em junho de 2020, afirma que o dia de seu parto foi o pior da sua vida. Ela, que já tinha ouvido relatos de maus tratos no hospital, fez de tudo para não emitir sons muito altos, por medo de ser destratada pela equipe, mas, ainda assim, não escapou de sofrer violência, além de também ter testemunhado outra grávida sendo maltratada. Além de ter sido ignorada pelos profissionais enquanto se queixava de dor e tratada com impaciência pela médica, Mayra passou muitas horas com dores intensas para ter parto normal quando, após a troca de plantão, descobriu que não conseguiria e foi submetida a uma cesárea. Beatriz Carvalho, 22, também relatou negligência por parte da equipe, visto que o seu pós parto foi seguido de uma hemorragia, e mesmo solicitando a equipe e afirmando estar com muita dor, ninguém lhe deu atenção e a intercorrência só foi constatada tempo depois pela médica.

O QUE É VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA E QUAIS SÃO OS SEUS EFEITOS?

Ser vítima de violência obstétrica gera traumas que podem ficar para a vida inteira. Gisele conta que precisará de acompanhamento psicológico para lidar com as situações que enfrentou no dia do seu parto. “Quem já passou pelo puerpério sabe o quanto é uma fase difícil, ainda mais de uma forma totalmente traumática, com lembranças e reflexos ruins.”, conta. A jovem recebeu relatos de mulheres que revelaram medo de ter outro filho e de retornarem ao hospital depois de serem vítimas de violência obstétrica. O marido de Gisele, no mesmo dia do ocorrido, procurou a enfermeira chefe do Hospital da Mulher, bem como a ouvidoria e assistente social para fazer a denúncia e o casal pretende formalizar a queixa no Ministério Público. Maya e Beatriz não prestaram nenhuma queixa.

Além de jamais ter sido procurada pelo Hospital da Mulher para esclarecimentos, Gisele ainda tem enfrentado tentativas de apagamento da sua denúncia. Uma matéria publicada no site da prefeitura afirma que a jovem foi “desmascarada” e que a sua denúncia apresenta uma contradição que a invalida. Um áudio do programa Transnotícias, da rádio TransBrasil, sugere que a direção do Hospital da Mulher pediu que mulheres ligassem para o programa e contassem boas experiências que tiveram. No Instagram da Fundação Hospitalar de Feira, órgão responsável pelo Hospital da Mulher, que tem como presidente a enfermeira Gilbert Lucas,  a publicação que rebate a versão da paciente, tinha cerca de 200 comentários e todos foram apagados. A maioria de ex-pacientes relatando experiências ruins vividas no Hospital. Uma mulher escreveu: “Passei poucas e boa nesse hospital pra ter meu filho a médica chegou até a dizer que se eu gritasse ela ia sair da sala e me deixar lá sozinha, que eu ia parir só. Revoltante só sabe quem passa”.

CENSURA

Um advogado consultado pelo Blog do Velame, considera a atitude da diretoria em apagar reclamações das redes sociais da Fundação como antidemocrática e censura à liberdade de expressão.  Internautas têm repudiado e relatado também estarem sendo bloqueados por criticar a conduta da administração.  Uma reportagem da TV Subaé, afiliada da rede Globo na cidade, também mostrou outros relatos de violência obstétrica no hospital, após exibição da reportagem que contou o caso de Gisele.

Gilbert nega intenção de censurar comentários. “O técnico excluiu todos os comentários bons e ruins porque tinha duas pessoas brigando dentro da postagem, então por cautela o mesmo excluiu todos os comentários. E não é a intenção da página” disse.  A versão da presidente não reflete a realidade, já que perfis de usuários que fizeram reclamações, além de ter os comentários apagados também foram bloqueados pela página. Apenas comentários elogiosos ao hospital foram mantidos no story da página.

VERSÃO DO HOSPITAL

Questionada pelo blog do Velame sobre os relatos das mulheres, Gilbert Lucas enviou a seguinte mensagem:

“Sobre o caso de Gisele , já estamos com todo relatório do prontuário e não procede a denúncia . Não existiu violência obstétrica , já solicitamos até a presença do acompanhante para uma reunião com a diretoria técnica para ela descrever todo prontuário . Informamos que em nenhum momento a paciente procurou a unidade para relatar qualquer queixa, o parto dela foi em junho e só soubemos de queixa da mesma através de vídeo dela na internet . Sendo assim conforme documentação recebida da equipe toda de plantão e prontuário não existiu violência obstétrica . O parto dela não evoluiu para normal e foi submetida a cesária mas está tudo descrito em prontuário. Sobre as outras denúncias algumas são de mais de 08 anos onde não se tinha classificação de Risco , CPN e enfermagem obstétrica na unidade , hoje a unidade e referência em parto normal e temos também vários relatos de partos positivos .O outro caso que a TV me passou de 2020 foi um parto prolongado também que foi submetido a cesária e que já está com a diretoria técnica para avaliação , mas também não tem nenhum registro da paciente em ouvidoria ou queixa na unidade . Sobre reclamação do direito ao acompanhante no centro cirúrgico não está sendo liberado, esclarecemos que existe um decreto estadual suspendendo acompanhamento nas maternidades no período da pandemia . Mesmo assim permitimos na CPN e nas enfermarias . Todos os casos que chegam na unidade são apurados e a Diretoria Técnica e coordenação de enfermagem disponível para esclarecimentos . Como é assistência de especialidade de urgência obstétrica todos os casos devem ser analisados individualmente Fico a disposição para visita em loco da unidade e conhecer a estrutura da CPN , mãe canguru , uti neo , casa da puérpera”.


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